Nina & Carolina

Por Os Cães do Parque


Seguindo uma triste tradição, conhecida de todos os protetores, o final do ano de 2010 trouxe novos personagens caninos para o parque. É na época das festas, das férias e das viagens que ocorre um grande número de abandonos de cães, por pessoas que, ao se ausentarem de suas casas, preferem descartá-los do que encontrarem alguém que cuide deles até que regressem.

Duas cadelas magrinhas, inseparáveis e obviamente irmãs surgiram nessa nova "leva". Desorientadas, assustadas e famintas acabaram se fixando por lá. Não era difícil de notar que haviam sido criadas juntas em uma casa e que, repentinamente, se viam sozinhas, num lugar estranho.

Passamos a monitorá-las no parque e a chamá-las de Nina (a de pelagem mais escura) e Carolina (a mais clara). Nina tinha, desde que apareceu, um ferimento em uma das patas que já havia ocasionado o aparecimento de uma bicheira. Por ser ela a mais assustada das duas, tratá-la não era tarefa fácil.

O pior - e óbvio - aconteceu na metade de Janeiro, quando Carol entrou no cio, atraindo vários cães das redondezas para o parque. Uma matilha barulhenta se formou e permaneceu por dias na área onde elas se fixaram. E cães, nessa situação, ficam agressivos. As cadelas, perseguidas por eles por dias seguidos, não podem se alimentar e nem dormir. 

Quem, como nós, consegue enxergar o que se passa, vê uma cena de crueldade. Pessoas comuns só conseguem sentir incômodo, espantar os cães, reclamar, resmungar. Das autoridades locais, desprovidas de protocolos a seguir diante de tal situação, nada se pode esperar. 

É diante de situações assim que a palavra "voluntariado" define com exatidão o que fazemos: ninguém nos pediu para auxiliar a imensa instituição pública na resolução daquele problema pontual. Nós vamos lá e fazemos porque queremos fazer. Nós, que somos só três pessoas, com um único carro, somos aptos a fazer de forma rápida e silenciosa, o que centenas de funcionários, com dezenas de veículos, não são.

É da nossa filosofia - não espere, não reclame, não peça: faça. 

Com as duas castrações agendadas, durante alguns dias tratamos de nos aproximar mais das duas arredias irmãs para conquistar sua amizade. Espantando os vira-latas que cercavam sem trégua a pobre Carolina, andamos na lama deixada pelas fortes chuvas de Janeiro, para alimentá-las. Por fim, na data marcada, depois de algumas horas de perseguição, conseguimos capturá-las, atirá-las dentro do carro e levá-las de lá.

 
Nina e Carolina foram castradas e após quatro dias de recuperação numa área restrita, onde tivemos autorização para isolá-las, as reintroduzimos no parque. 



Durante os dias seguintes, as monitoramos com atenção. Conseguimos fazer com que se fixassem em uma área, acostumando-as a receber alimentação em um lugar específico, evitando que ficassem perambulando pelo parque.

E deu tudo certo.

Livres do incômodo da perseguição dos cães e recebendo a atenção também de alguns funcionários, adaptaram-se bem à rotina do lugar. Durante os três meses em que foram "cães do parque", tornaram-se figurinhas cativantes e queridas. Carolina, a fêmea alfa, de bela postura, de olhar profundo e encantador, amorosa e inteligente. A magrelinha Nina, tímida, manhosa, sempre seguindo os passos da irmã.

Não chegamos a fazer uma campanha para adoção das duas, mas mesmo assim, a sorte lhes sorriu no início de Abril de 2011. 

Quando anunciamos outras duas irmãs para adoção, as filhotes Cacau e Diana, recebemos uma enxurrada de emails de interessados. Logo nos primeiros dias após o anúncio sair, escolhemos quem ficaria com elas - mas os emails de interessados não paravam de chegar. 

Entre eles, veio o contato da Liane, que prestou informações das quais gostamos muito: morava num sítio e tinha a intenção de adotar uma - ou até duas - fêmeas, que certamente se entenderiam melhor com seu outro cão adotado, um labrador macho. Oferecemos várias opções para ela, mas dando muita ênfase às duas irmãs que gostaríamos muito de tirar do parque - e que só poderiam ser adotadas juntas e por alguém que pudesse oferecer a elas um bom espaço.

E aconteceu o que queríamos: Liane escolheu Nina e Carolina. 

Com a entrega das duas combinada para o domingo daquela mesma semana, bastaria tirá-las do parque um dia antes para que recebessem um bom banho antes de seguirem para o novo lar. Mas por pouco tudo não foi colocado a perder na sexta-feira, quando Carolina envolveu-se numa briga com uma capivara e levou uma dentada na anca esquerda. O profundo ferimento poderia ter sido fatal, caso fosse em outra parte do corpo. Atendida no Hospital Veterinário da UNIP, para onde a levamos graças a um ofício expedido pela direção do parque, teve que ser sedada e levou oito pontos.

Depois disso, para evitar qualquer outro acidente, ainda permaneceu isolada por mais 24 horas no quintal da administração do parque, juntamente com a inseparável irmã. Mesmo sabendo do "acidente", a Liane não se importou em receber uma de suas adotadas costurada: os pontos só poderiam ser removidos depois de 10 dias.

Viajando até a casa nova, 10 de Abril de 2011.

Finalmente, na noite do sábado, dia 09 de Abril, Nina e Carolina deixaram o parque para sempre. No domingo, 10 de Abril de 2011, enfeitadas e de banho tomado, rumaram conosco, numa viagem de cerca de uma hora, até Atibaia, SP.

Primeiro contato com a Liane.

No sítio, numa tarde chuvosa, foram recebidas pela Liane e sua numerosa família. Conheceram também o destrambelhado labrador Astor, com quem passaram a dividir o quintal.

Diferente dos filhotinhos, que passam pouco tempo pelas nossas vidas, quando cães do parque são adotados, é muito marcante. Convivemos muito tempo com eles e quando vão embora, há um misto de alegria e tristeza.

É grande a alegria por saber que elas terão a proteção de um lar: tirar os cães do parque é o objetivo original do nosso trabalho. Mas - é inevitável - sentimos saudade das amorosas e divertidas irmãs.

Nina e Carolina não moram mais no parque: chegaram juntas, saíram juntas. E, juntas, vão viver muitos anos, até se esquecerem que um dia foram abandonadas.

Nina e Carolina
Janeiro/2011

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